A cada dia avança o mar e encolhe-se a ilha;
Eu, a rabiscar com tinta em folha, esvaziava mais uma garrafa a servir de aposta;
Lançei-a ao mar e esperei - em vão - resposta.
Qualquer.
Não fosse a primeira garrafa, a mim bastaria a ilha - talvez.
Mas nas letras que ela continha eu vi um pedaço que faltava de mim;
Alguém em outra ilha escolheu lançar a garrafa, a esmo.
Um pedaço de alguém! - assim mesmo.
Não fosse a primeira garrafa! Escolhi responder. Ousei.
E mais garrafas vieram - milhares, milhões. Não sei.
Mas não respostas.
A cada mil encontro mais uma pedaço do quebra-cabeças.
Não me parece ter final.
E quando eu respondo, é só porque queria que soubessem que a peça serviu.
Que guardo-a sempre comigo. Sempre. Que, sempre que posso, transcrevo-a.
(Pois sou só parte dono do que sou.)
Que sirva a mais alguém - a um amigo.
Também transcrevo pedaços que já tinha comigo.
Mas a cada dia lanço ao mar outra garrafa de gratidão. Esperando resposta - em vão.
Esperando uma reação - um "Disponha". Só gostaria de saber que chegou.
Que soubessem que me tocou.
E sonho que sejam tão sedentos quanto esse naufrágio de mim. E que os toque.
E nada.
Eu rabisco com sangue e fúria e febre e fé,
Porque apenas tinta em folha não basta. Sabe quem já leu.
Porque a cada dia encolhe-se a ilha-eu,
E espero, sedento, resposta. Qualquer.
Antes que só reste aos meus olhos o sal e o mar e eu já não possa mais ler.